sábado, 31 de agosto de 2013

Um pouco alto

As cores começam a mudar
e as linhas já não mais delimitam formas.
As palavras ficam fluentes por conta própria.
As árvores se soltam
e os postes dançam imprudentemente pelas ruas.
Álcool.
As placas nada sinalizam nas vias sanguíneas.
Alto.
Um preço a pagar ainda mais alto.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Mais ou menos

Mais sensível e seria frágil
Mais próximo e seria perigoso
Mais álcool e seria outro
Mais escaldante e seria fogo
Mais podre e estaria morto
Mais armas e estaria atirando
Mais preliminares e seria foda
Mais ansiedade e seria suicida
Mais um passo e estaria louco
Menos pensar hoje e mais viver até amanhã

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Endurecendo a gelatina

O amor não sente frio;
sobe a montanha
e espera pacientemente.

O amor não é sutil;
é a própria dor
e machuca até quando é bom.

O amor é possessivo;
faz duas pessoas prisioneiras
em causa própria.

O amor é ignorante;
ignora os sinais de rejeição
e evita discutir a relação.

O amor é muito infantil;
prega peças
e chora quando contrariado.

Não existe antídoto;
só existe trauma.
O diagnóstico clínico
é que afeta a alma.
Apesar de ser lindo,
ele nos deforma;
leva o egocentrismo
ao estado de coma.

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Afago


Dia após dia

A presença precisa ser lubrificada
O atrito só se dá com o contato
É melhor se preparar para a fricção
O amar a seco é o amar cego
Mire-se tudo em cem porcento
Para conseguir uma nota alta
No melhor de dois tem-se um amor
A melhor pausa é quando se deitam
Contorcem-se para gozar junto
E nessa lida já é feito o tal amor
Não há ego que resista à competição
Nem todo amor é feito com a mão
Nem toda pessoa tem participação
Nem toda palavra dá explicação

domingo, 25 de agosto de 2013

Mais uma canção de metal

crânios espalhados pelo chão
o metal é embainhado agora
esgotado o guerreiro caminha
a sensação de pesar o toma

mais uma canção de batalha
são apenas os ossos do ofício
perturbado é sempre o herói
vilão vítima do próprio vício

que os deuses o condecorem
ele ainda crê em algo nobre
que os céus possam perceber
é pela vida e não pelo cobre

mais uma canção de metal
mais algum inimigo invisível
empunhando a trilha sonora
o sonho envelhece possível

Livre rumo a terra sem dor
Livre derrotando o horror
Lutando é o que sabe fazer
Livre pra poder renascer




quinta-feira, 22 de agosto de 2013

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Exemplo de um ciclo

Enquanto o guri ainda arriscava os primeiros passos,
nada parava em seu estômago e ele convalescia.
Não havia quem desse remédio...
Ele perdera até os poucos cabelos de bebê.
O pai vendera tudo em troca de cura,
mas, sem resultado, a família só esperava pelo seu fim.
Então, um benzedor deu a palavra:
sete palmos de folha de bananeira,
sete palmos de erva-de-bicho,
nove coquinhos numa garrafada para beber e se banhar.
Em pouco tempo, ele aprendeu a andar,
o cabelo cresceu,
o guri cresceu.
Ele aprendeu a fumar,
e aos 38 anos morreu de enfisema pulmonar.
Agora, jaz a sete palmos embaixo da terra.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Toró


A lista do que parece

todo conflito parece que parte do querer
a paz verdadeira não parece existir entre dois exércitos
a paz de espírito entre dois espíritos parece solitária
estão grisalhos demais os meus argumentos
e meus cabelos parecem que ainda podem cair
parece que quem não quer mais nada, já morreu
parece que quando um não quer,
mais cedo ou mais tarde, dois brigam
a paz se parece com monotonia
o conflito parece ser a regra
o direito à opinião parece ser conflitante
e quem diz, prefere dizer
e quem ouve, parece preferir não ouvir 

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Medo de fluir

Existe um tipo de beleza que não se vê
Uma imagem que não precisa de óculos
Não tem cor
Tem consequências vivas
Mesmo se mantendo inerte em alguns momentos
Não adianta forçar a vista
Não adianta tentar negar
Não adianta tentar reprimir
E dizer-se imune ao calafrio
Ou ao calor
Não adianta argumentar racionalmente
Quem tem pele sente
Quem está vivo tem coração que bate
Quem não quer sentir vive pela metade

E se todo lugar comum se encontra aqui
Aqui é o lugar de todos
Ou daqueles que produzem lágrimas
Os que não as produzem
Secam com olho seco o mundo suculento e saudável
Além dos fluidos que são vitais
Há algo que ainda flui mais

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Dia bom

O dia bom está espremido
entre os dedos cruzados.

Dia ruim

Sussurraram pra que eu falasse baixo.
Gritei: "O quê?"

Me pediram um beijo, dei um abraço.
Por quê?

Só faço favor se nada melhor 
eu puder fazer.

Enquanto você, 
correto hoje,
cheio de si,
faria tudo pra que eu fosse você.

Socializo por cinco anos,
mas não consigo, por cinco minutos, conviver.

E só por maldade - 
essa é a minha qualidade -
continuo sendo eu mesmo
e a sofrer.



quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Pseudo-ser

Café pra acordar
Erva pra relaxar
Um pouco de pó pra ligar
Tinta pra tingir
Enchimento pra iludir
Álcool pra descontrair
Óculos pra ver
Comprimido pra enrijecer
Implante pra ter

Quanto do ser é o próprio ser?

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Onde tocar


O quê?

Que o meu mundo não cabe
num copo de vinho, é sabido
Que o meu corpo nasceu nu,
não deveria ser novidade
Que a vontade de ter personalidade,
é algo próprio do indivíduo
Que as diferenças aparecem
num simples movimento da mão
Que o vocabulário que eu uso,
não precisa ser o mesmo que o seu
Que eu vou enxergar de forma diferente
do meu vizinho, é visível
Que o meu momento,
não segue o seu relógio
Que a paz que eu procuro,
não possa, talvez, nem encostar na sua paz

Que bandeiras são essas que ainda temos que erguer
Que discussão é essa que temos que ter
Que opinião é essa que racha o mundo no meio
Que cor é essa que eu vejo até de olhos fechados
Que sujeira é essa no mundo vinda do próprio mundo
                                        ?

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Permitir-se

Musculoso é o choro da sensibilidade,
vindo lá do fundo,
de algum lugar próximo da revolta.

Gordos são os olhos da crítica
que não se permitem ver
de onde partem os músculos do prazer.