sábado, 30 de julho de 2011

A decisão

"Não é porque todos fazem isso que você também tem que fazer.Esse é um investimento em você!"- ele disse.
"Eu sei que isso seria bom pra mim.Pra me libertar das amarras.Mas parece que quanto mais eu penso nisso, mais eu volto pro sistema tradicional de criação!"- ela argumentou.
"Questionar valores vai contra o negócio familiar, eu sei.Mas você tem que pensar no valor que esse passo tem pra você!E isso não vai ser uma mancha no seu currículo.Só vai te dar mais experiência!"
"Porque existe tanta pressão sobre mim?Eu vejo que para outras pessoas é mais fácil tomar essa decisão!Uma amiga minha agarrou a primeira chance que ela teve!"
"Talvez você não deva pensar que é 'a decisão'.Você é criativa!Imagine que está abrindo uma porta, mas que é só uma porta pequena, para uma coisa maior!"
"É, isso faz parte da criação!Esse departamento é meu.Não vou entrar nessa com toda a minha família!Nem haveria espaço pra eles!"- ela brincou.
"Nesse caso, o meu departamento é que iria ficar em má posição!"- ele riu."Então, vamos?"
Ela olhou um instante pra ele e depois assentiu com a cabeça.Ele, então, ligou a ignição, deu a seta e entraram no motel.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Todas as cores

Dois papéis

Eles não queriam que elas mudassem.Não queriam que elas mudassem o jeito de andar, de tocar, de sorrir, de se doar, e nem o jeito de pedir com os olhos.
Elas queriam que eles adivinhassem.Tudo.Juravam e acreditavam piamente que a magia estava no adivinhar.Elas esperavam por surpresas, e quem espera por surpresas pode se decepcionar.
Eles não acreditavam que fantasiar ajudaria no dia-a-dia.Eles sabiam que o compromisso agora era real, então tinham que ser práticos e realistas.Também pensavam que fantasiar só poderia ser com o proibido.
Elas não entendiam a indiferença e cobravam atitude deles das mais diferentes formas.
Eles não entendiam,  pois eles estavam ali do lado o tempo todo.E se sentiam sufocados.
Elas se magoavam e pediam mais atenção.
Agora elas querem que eles mudem.
Eles não querem que elas mudem em nada.Eles só querem que elas continuem a andar, tocar, sorrir, se doar com o olhar.Eles só não querem que elas exijam que eles pensem como elas.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

A lenda das Cataratas do Iguaçu

Há muitos anos atrás, a tribo dos Caigangues habitava as margens do rio Iguaçu, que naquela época, corria livremente sem quedas.Os  Caigangues eram adoradores de M'boi, o deus em forma de grande serpente, filho de Tupã.
O cacique da tribo, chamado Ignobi, tinha uma linda filha que se chamava Naipi.Ela era tão linda, que quando se admirava nas águas do rio, elas paravam.Então, por sua beleza, Ignobi havia prometido Naipi à consagração do deus M'boi.
Porém, havia na tribo um guerreiro chamado Tarobá que era apaixonado por Naipi.Então, quando chega o dia da consagração, eles resolvem fugir numa canoa pelo rio.M'boi fica furioso pelo desrespeito e resolve agir.Ele penetra o seu enorme corpo na terra, e se contorcendo passa por baixo do rio, criando a rachadura que se transforma em catarata.O casal apaixonado despenca queda d'água abaixo, e ao cair Tarobá se transforma em uma palmeira, enquanto que Naipi vira uma pedra.Sendo assim, ele foi condenado a permanecer para sempre às margens das cataratas, e ela estará eternamente condenada a ser surrada pelas águas do rio, enquanto M'boi os vigia.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Anatomia

Abertus totalis
 As flores são consideradas os órgãos sexuais das plantas. Se você fosse uma planta, qual seria o seu "modelo"?
Duofuris apertadis

Retinhus quiamarelias

Grossus tortis


Balanço

Com a faca rasgando o peito em dois
de um lado a indiferença
de outro a libido aflorada
de um lado a rotina
de outro a euforia do álcool
Com a dor rasgando agora e depois
de um lado o compromisso
de outro lado a dúvida porquê
de um lado o respeito
de outro lado o mundo inteiro

E o corte exposto só pra mim
e o meu rosto exposto pra ver
e alguns sofrem e morrem
e alguns morrem ao viver

Pra não errar na dose
talvez uma droga que me sirva
pra eu me internar
talvez na minha própria vida

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Jogo

Colocando lentamente as duas mãos por baixo da peça, ele a levantou, e depois puxou para cima para retirá-la.Depois, com abilidade, e usando apenas uma das mãos, ele soltou o fecho que prendia a segunda peça pela parte de trás.Em seguida, apertou três botões para poder soltar a terceira peça que ficava na metade de baixo.Essa era a maior, uma peça larga e rodada, de modo que quando foi solta, caiu diretamente no chão.Com a quarta peça, ele teve que usar os dois polegares para puxá-la para baixo, quase até o chão.Já nas últimas duas peças, e com a respiração ofegante, ele se abaixou, soltou as fivelas e puxou uma de cada vez para a frente.
A primeira parte do jogo em que ele teria que fazer tudo tinha acabado.
Ela estava nua, e agora era a vez dele.

domingo, 24 de julho de 2011

27

O rock n' roll é um fogo.
Ele incendeia multidões.
Os artistas brincam com fogo. 
Algumas pessoas saem chamuscadas.
Algumas pessoas renascem das cinzas.
Algumas pessoas se queimam para sempre.
Algumas pessoas se transformam numa verdadeira pira.
Pra que haja chama é necessário oxigênio.
Algumas pessoas não dão tempo do ar entrar.
Elas não respiram.
A chama se esvai.
O fã quer mais.
Ele chama.
Chama Hendrix.
Chama Joplin.
Chama Morrison.
Chama Jones.
Chama Cobain.
Chama Winehouse.
São todos chamas eternas.

sábado, 23 de julho de 2011

Dia nublado

Aparências

O volante encostava na barriga do motorista revelando um diâmetro abdominal bem avantajado.Enquanto isso, o aprendiz procurava uma estação de rádio que lhe agradasse.Quando finalmente parou de mexer no rádio, a música que tocava fez o motorista contorcer o rosto.
"O que é isso?"- perguntou o motorista.
"É um pancadão do bom!Som pra dançar a noite inteira!"- disse o aprendiz.
"Isso faz mal pros ouvidos e pra inteligência.Me passa aquele porta cds que eu vou te mostrar uma coisa."
"O que você vai tocar?Eu gosto de música pra dançar!"
"Não dá pra dançar aqui dentro.Às vezes, a música que faz bem é aquela que foi feita só pra escutar."-disse o motorista, colocando um cd."Muitos músicos fazem música pela música, sem pensar na dança.Isso é jazz, meu amigo!"
"É, até que tem uma batida legal.Mas não tem letra?"
O motorista olhou pro aprendiz, apontou pro ouvido e continuou dirigindo até a garagem.Quando chegaram, o motorista desligou o som.
"Não sei se você aprendeu alguma coisa sobre música, mas o itinerário do caminhão de lixo você já sabe.Esteja aqui às 6 hs.A partir de amanhã, você vai assumir o volante."

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Miscigenação

Numa coletiva para a imprensa, o diretor de cinema Luís Inácio "Lula" da Silva anunciava:
"Para representar grandes personalidades que foram contemporâneas no século passado, está sendo desenvolvida uma das maiores coproduções do cinema.Ambientada nos anos 60, ela contará com grandes atores e atrizes de vários países.
No papel de Pelé teremos Wagner Moura; como Salvador Dalí, Jamie Foxx; Janis Joplin será Lucy Liu; no papel do Papa João Paulo ll, Woddie Allen; representando Tom Jobim, Roberto Benigni; Marilyn Monroe será Thaís Araújo..."
Então, de repente, eu acordei do meu sonho estranho.Era um daqueles sonhos em que o rosto não bate com a pessoa.
Mas mesmo assim, ainda foi possível visualizar Lázaro Ramos no papel de Martin Luther King.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Atento

Se eu me exponho
é osso
Se abaixo a guarda
o pescoço
É fratura exposta
da alma
E num movimento
sem calma
Mais rápido que
o respeito
Uma bala atinge
o meu peito
Vinda da pistolíngua
ao léu
De alguém que nunca
foi eu

terça-feira, 19 de julho de 2011

Os indescritíveis ovos em Mi bemol

Uma visita rápida

Passava das onze da noite quando eles foram embora, mas eu continuei olhando as suas luzes traseiras até desaparecerem.Foram em direção a cidade, onde provavelmente, seriam só mais algumas luzes misturadas entre tantas outras no trânsito, nos prédios, nas fachadas.
Não tivemos tempo pra muita coisa.Eles só passaram pela minha casa, e parecia que estavam esquadrinhando o meu terreno, mas não ouvi nada deles.Então, se foram sem nenhum contato mais direto.Acho que com os vizinhos também tinha sido o mesmo, apesar de que na verdade, os meus vizinhos mais próximos moravam a uns oitocentos metros da minha casa, de modo que não dava pra saber se eles tinham tido alguma atenção especial.Também podia ser que nem todos os vizinhos estivessem em casa e os tivessem visto.
De qualquer forma, me senti privilegiado mesmo não tendo entendido bem o motivo da visita.Muitas pessoas acham que pode haver um interesse científico por parte deles.Outros acham que é mais sociológico, já que eles mantém um contato mais direto com algumas pessoas.
Seja um interesse religioso, científico, sociológico ou o que for, eu nunca vou esquecer aquelas luzes vindas do espaço que ficaram pairando acima do meu sítio.

Quem nunca fez ...mente

Eu olho indescritivelmente.
Tu pensas ruidosamente.
Ela ama entulhadamente.
Ele mente desfiguradamente.
Nós transamos distraidamente.
Vós prestais atenção alucinadamente.
Elas pensam irracionalmente.
Eles correm carinhosamente.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

De volta pra onde veio

No primeiro encontro, eles decidiram fazer uma trilha num parque da cidade.
"Pra você!"- disse ele, entregando a flor para ela.
"Esta flor, não!"- ela respondeu, devolvendo a flor para ele.
"Como assim?Qual o problema?"
"Porque você não pegou uma daquelas?"
"É uma agressão!Olha só, ela ainda está tão bonita!"
"Porque agressão?Então você nunca deu um buquê de flores para uma mulher?Cadê o seu romantismo?"
"Essas flores aqui não nasceram pra ser tratadas assim.Esse é o habitat delas.É como se eu fosse até a sua casa e levasse um vaso embora como lembrança!Além disso, eu te dei uma flor!Como é que isso não é romântico?"
"Acho que dar uma flor é algo romântico quanto tem algum sacrifício.A sua intenção foi boa, mas você não valorizou!"
"Sacrifício?O sacrifício é todo daquela planta que floresce todos os anos.Ela enche os nossos olhos com a sua beleza sem cobrar nada!E pessoas como você acham que podem ficar mutilando essa beleza!"
"Você está exagerando!"
"Você não entendeu nada!Esta flor aqui, que eu te dei, vai voltar pra onde ela veio.Eu achei que podia te dar como um gesto de integração com a natureza, mas eu estava errado.Você acha que está acima da natureza.Então, realmente você não merece esta flor!"- ele disse, indo embora, após jogar a flor de volta ao chão.

domingo, 17 de julho de 2011

O desapegado

- Não sei que feiticeiro é esse chamado Louis Vuitton.Só sei que bolsa é uma coisa qualquer, onde você guarda as coisas mais importantes dentro.
- Não sei o que são calças com caimento perfeito.Só sei que essa idéia não funciona em certos corpos.
- Não sei que cheiro tem esse tal Chanel No 5.Só sei que o fundamental é tomar banho.
- Não sei para que serve uma coleção de sapatos.Só sei que corre-se o sério risco de morrer sem ter usado todos.
- Não sei porque matar animais selvagens sem estar passando fome.Só sei que algumas pessoas acham que as suas peles servem de roupa.
- Não sei o que é moda.Só sei que ela força as pessoas ao consumo de coisas novas antes que usem suficientemente as antigas.
- Não sei quem inventa as novas tendências.Só sei que os ditadores políticos têm o mesmo tipo de poder para influenciar as massas.
- Não sei qual o poder que se sente ao usar um "D" e um "G" nas hastes dos óculos.Só sei que os óculos bons são os que me fazem enxergar.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Velho

quando eu for velho
e todos me ultrapassarem
quando eu não conseguir mais
erguer meus joelhos
quando eu precisar de paciência
com a minha bexiga preguiçosa
quando não tiverem paciência
comigo
quando eu não for mais fluente
nem na minha própria língua
quando eu souber os nomes
de todos os remédios
quando o outro lado da rua
for longe demais
quando as rugas começarem
a brigar por espaço
quando melhor idade
for um consolo ridículo
eu quero lembrar
que um dia eu fui jovem
e tive a lucidez de escrever
pra quando a memória falhasse

Reciclagem

PapelpapelpapelPapelPapelPapelpapelPapel
Faça o seu papel: recicle!
                                                   Papelpapelpapel                             Papelpapel

quinta-feira, 14 de julho de 2011

O beijo

Foi um beijo que durou três minutos e quatro segundos.A respiração oscilava entre momentos intensos e mais delicados.Ela produzia frases que eram abafadas pelas mãos dele, e que a traziam de encontro aos seus lábios.Eram frases, mas não continham palavras.Não era o momento de se falar, e sim, de se tocar.Gemidos dele, entre agudos dela, e tudo era harmônico.Ele a contornava com a boca, como que delineando as suas formas e orquestrando os seus sons.E ela correspondia sem destoar, naquele dueto que parecia um só, para que existisse o beijo.O encaixe do corpo dela, que ia da boca dele até a ponta dos seus dedos, era físico e era de emoções que ela exprimia com todos os sons que cabiam naqueles poucos minutos.As mãos dele, de um lado e de outro, corriam, se abriam e se fechavam, juntando tudo o que ela oferecia para produzir o ápice daquele momento: um solo de gaita. 

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Estereótipos

- Os brasileiros metem os pés pelas mãos por causa da prática do futebol
- Os alemães não sofrem de infecção renal graças à grande ingestão de cerveja
- Os japoneses pegam as japonesas usando "pauzinho"
- Nos Estados Unidos, as crianças são amamentadas com silicone ao invés de leite
- Tudo é feito em maior quantidade na China, inclusive pessoas
- Todo francês sabe cozinhar porque restaurante de comida francesa é muito caro
- Os árabes deixam a barba crescer para não serem confundidos com as mulheres que também usam vestido
- Os relógios suiços só não são mais precisos porque não são feitos na Inglaterra
- A Jamaica é o maior café holandês do mundo
- O esporte nacional da Argentina é a catimba

Dois turnos

Às duas da manhã, ela chegou exausta no camarim.A casa estava bem cheia mesmo sendo domingo.O problema é que ela teria que acordar cedo.Havia ficado feliz com a sua performance, mas em algumas músicas, o iluminador não tinha criado o clima adequado.A sincronicidade nesse tipo de apresentação dependia de muito ensaio, mas os iluminadores não davam a mínima.
Agora vinha a parte mais chata: ela tinha que se "desmontar".Pelo menos esta noite, ela havia usado a máscara, então não precisava retirar tanta maquiagem.Mas de qualquer forma, era a parte mais trabalhosa da noite, e a que dava menos prazer, pois era quando ela se despedia da personagem.Mesmo assim, tudo valia a pena, porque ela era muito querida na noite e as suas performances faziam muito sucesso.
Depois de colocar a sua roupa do dia-a-dia, era ir pra casa, tomar um banho e descansar.Às seis e meia, ele tinha que estar de pé para ir ao trabalho na metalúrgica.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Entre linhas

Depois de escolher o ramalhete de flores, ele pediu um cartão, pois queria escrever uma mensagem.Quando a balconista lhe entregou o cartão, ele tirou uma caneta prateada do bolso e escreveu uma mensagem curta.O entregador que estava esperando que ele terminasse para poder fazer a entrega, reparou que ele era canhoto e tinha uma aliança.
O endereço ficava a poucos quarteirões dali, e ele chegou rápido em sua bicicleta.Quando chegou no quarto andar, tocou a campainha do 41 e esperou.A moça que atendeu devia ter no máximo 25 anos, e pelo modo que estava vestida devia ter acabado de chegar do trabalho.Tinha lábios carnudos e o cabelo cheio tinha um estilo afro.Ela fez uma cara de surpresa, pegou as flores e deu uma gorjeta ao entregador.
No dia seguinte, mais ou menos no mesmo horário, o mesmo cliente, as mesmas flores, o mesmo endereço.No caminho ele foi pensando nos mistérios da sua profissão.O cliente em questão devia ter pelo menos 45 anos, era casado, bem vestido, e já era a segunda vez que mandava flores pra garota.Isso o deixava curioso pra saber o que poderia acontecer.
Quando chegou lá, ela estava mais à vontade do que no dia anterior.Trajava um vestido curto o suficiente pra que ele visse as pernas bem torneadas.Mais uma gorjeta, e ele agradeceu com um sorriso.
Na terceira vez que foi entregar as flores, ela pareceu estar triste, e enquanto pegava a gorjeta e saía, ela ficou parada na porta olhando as flores.
Passados mais alguns dias, o mesmo cliente voltou e fez o pedido de sempre.Mas dessa vez, o entregador notou algo diferente: ele não tinha mais a aliança.Então no caminho, ele fez o que nunca tinha feito antes: abriu o envelope e leu a mensagem.Ela dizia:
"Agora podemos ficar juntos.Sou um homem livre."
Ao chegar no apartamento, ela parecia estar sem paciência.O entregador, por outro lado, estava sorridente.Quando ele recusou a gorjeta, ela achou estranho, mas acabou achando graça da situação.
Já na calçada, ele retirou o cartão do cliente do bolso, amassou e jogou numa lixeira.Enquanto isso no apartamento, ela sorria depois de ler:
"Do seu entregador de flores que nunca usou uma aliança." 

As três melhores desculpas

No estacionamento:
"Não, eu não vi a placa para deficientes físicos.Eu sou deficiente visual."
Na festa:
"A gente não estava se beijando.Ela se afogou com a cerveja, então eu comecei a fazer respiração boca a boca nela!"
Na batida policial:
"Eu não sou traficante.Eu não ia vender todos esses papelotes.O senhor me pegou justo no dia em que eu ia tomar uma overdose!"

domingo, 10 de julho de 2011

Extremos da cultura

Quando ouvimos a palavra cultura logo pensamos em algo positivo.Mas a cultura pode ser muito subjetiva, causando surpresa ou até indignação.
Entre seres humanos de diferentes partes do mundo, com culturas extremamente diferentes, quais são os limites?Qual é o limite para um esquimó, e qual o limite para um aborígene australiano?
Pular de plataformas rudimentares com os tornozelos presos por cipós na tribo Bunlap é um rito de passagem pra provar a bravura.
Os homens crocodilo da Papua Nova Guiné têm esse apelido por passarem por um ritual em que a pele é cortada pra ficar parecida com o couro do crocodilo.Eles acreditam que assim se tornam tão fortes quanto os crocodilos.
Os índios Saterê-Maués colocam as mãos dentro de luvas infestadas de formigas tucandeiras, cuja picada causa dor terrível e febre, como rito de passagem para a vida adulta.
A suspensão humana, em que ganchos perfuram a pele para que o praticante seja suspenso, é uma prática antiga entre vários povos, em sinal de religiosidade, ou hoje em dia, de adrenalina.
Causando dor em quem pratica ou choque em quem assiste, o que essas coisas provam?Talvez nada, já que a dor ou o choque cultural são coisas comuns entre os seres humanos.Talvez o ser humano só queira chegar ao limite da vida, perto da morte, ao extremo, só pra poder voltar pra vida mais forte.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

De passagem

Quando parou a moto na porta do bar, todos os olhares se voltaram pra ele.A roupa de couro, o cabelo longo, os óculos escuros, tudo era novidade pra gente daquela cidadezinha.
Tirou o capacete e o prendeu no alforje.Uma senhora que passava fez o sinal da cruz ao reparar nos adesivos e detalhes em formato de caveira que a moto ostentava.Depois desceu da moto e enfiou a mão no bolso.Algumas pessoas pareciam não ter coragem de olhar diretamente pro forasteiro, mas aquele gesto chamou a atenção de todos.Porém, quando tirou a mão do bolso todos viram que era apenas um maço de cigarros.Então, alguns se desinteressaram e voltaram a beber e conversar.
Ele começou a procurar pelo isqueiro nos outros bolsos, e ao tirar a mão de um deles, derrubou o seu canivete.O barulho que fez ao cair sobre o degrau de madeira,assustou um cachorro que cochilava na entrada do bar e chamou a atenção de todos novamente.
Ele apanhou o canivete, colocou no bolso outra vez e achou o isqueiro.Porém, percebeu que os cigarros haviam acabado.
Com todos os olhares sobre ele novamente, entrou no bar e perguntou ao balconista:
"Você vende cigarros sem nicotina?"

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Percurso

Depois de vestir as calças, colocou a camisa e calçou os sapatos.Sentado na frente do espelho, ele se olhou pela última vez, e pensou no que poderia acontecer em instantes.Ele estava pronto para ir até a prefeitura, onde várias outras pessoas seriam recebidas pelo secretário de obras.
Se dirigiu até a porta, saiu e trancou-a, e antes de chamar o elevador, conferiu se estava com o celular no bolso.Quando o elevador chegou, um vizinho que estava chegando no seu andar, segurou a porta pra que ele entrasse.Ele agradeceu e apertou o botão do térreo.Cumprimentou o porteiro ao chegar na entrada, e passou pela porta.
Seriam cerca de dez quarteirões até a prefeitura.Ele respirou fundo e partiu.Começou a pensar nos pontos que ele gostaria de tocar ao conversar com o secretário.Pelo caminho, foi observando as coisas que ele melhoraria na cidade, se pudesse.Não faltavam exemplos que poderiam desanimar, mas ele era um lutador, e aqueles quarteirões mal conservados por onde ele passava só serviam de estímulo.
Ao chegar na frente da prefeitura, viu outros cadeirantes que esperavam por uma maneira de entrar.Eles olhavam pras escadarias e conversavam sobre acessibilidade, o motivo da reunião.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Entre fases

Ela estava no jardim comendo a sua salada perto da piscina.Folhas verdes era o que ela adorava.Além disso, aquela dieta fazia muito bem à sua pele.
Sempre aproveitava aqueles momentos no jardim para se banhar ao sol também.Ela era jovem e sentia as mudanças que ocorriam no seu corpo.A ansiedade aumentava o apetite e mudava o comportamento.As descobertas eram quase que diárias.Hoje ela estava ali, percebendo tudo à sua volta.Entre as plantas do jardim, à beira da piscina, ela se integrava à paisagem.
Mas aos poucos ela foi sentindo uma espécie de preguiça, de letargia.Só queria ficar ali parada.Era como um sono irresistível.Então ela se aconchegou na sua manta, e foi ficando, ficando...
Quando começou a voltar a si, percebeu que estava diferente.Aquilo tudo que a envolvia já não era tão aconchegante.Ela sentia vontade de se espreguiçar, mas teve de se esforçar um pouco.Se esticou toda; se debateu um pouco; se sentiu maior; abriu as  asas.
A lagarta agora era uma borboleta, e podia voar.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Sem milagres

Não quero que transformem água em vinho; quero que a água potável não acabe.
Não preciso de uma estação espacial; preciso tratar dos problemas daqui da Terra.
Não preciso de um túnel que esconda os problemas embaixo da terra; quero que as soluções venham à tona.
Não quero estádios de futebol; quero que o povo tenha orgulho porque tem infra-estrutura pra viver.
Não há necessidade de ressuscitar os mortos; os vivos é que têm que fazer o trabalho.
Não quero o dia disso ou daquilo; quero o dia que teremos liberdade de comemorar o que quisermos.
Não quero que governantes bons entrem num sistema ruim; quero que mudem o sistema.
Não preciso da pseudo-superioridade humana; quero humanos que saibam que são parte da natureza.
Não há como explicar o preconceito; há que se entender a diversidade.

sábado, 2 de julho de 2011

Café pra dois

Ele estava sentado numa mesa no canto do café que estava lotado.Escrevendo no seu bloco de notas, ele às vezes levantava a cabeça e olhava as pessoas nas outras mesas com aquele olhar de quem está procurando as palavras certas pra escrever.
De vez em quando, ele tomava um pouco do café que havia pedido, e que já começava a esfriar.Ele estava num café, tomando café, mas isso era só um cenário; ele estava mais interessado no que estava escrevendo.Naquele dia ele estava inspirado pela mulher que havia visto, ali mesmo, no dia anterior.Ela era magra, cabelos castanhos encaracolados, de pele morena bem escura e estava com um vestido branco.Não era assim tão bonita, mas se movimentava de um jeito diferente das outras pessoas.E a impressão que ficou pra ele, era que enquanto todos só se mexiam, ela dançava.
Então, num dos momentos em que ele levantou a cabeça, ele a viu entrando.Não estava de vestido branco desta vez, mas era ela.Ele reconheceria aquele andar mesmo depois de uma década.
Ela parou, olhando ao redor à procura de uma mesa.Estavam todas cheias, e a única que tinha cadeiras vagas era a dele.Num impulso, ele levantou a mão na direção dela e apontou uma cadeira.Ela olhou pra ele por um segundo, e então decidiu ir em direção à mesa.
"Oi!As mesas estão todas ocupadas.Posso dividir com você?"- ela disse.
"Claro!"
Enquanto ela se sentava, ele acrescentou:
"Estava te esperando."E passou o bloco de notas pra ela.
Ela franziu a testa sem entender, mas começou a ler:
"Ele estava sentado numa mesa num canto do café que estava lotado.Escrevendo..."

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Campanha pela presevação da língua portuguesa

Com a globalização, ficou fácil entrar em contato com pessoas do mundo inteiro.E a língua internacional é o inglês.Mas isso não quer dizer que devemos encher nossa língua de termos em inglês (ou outra língua) a todo momento.É lógico que quando não há um equivalente em português, não temos alternativa.Porém, em muitas áreas, os profissionais usam muitos estrangeirismos, e acabam levando-os para a vida pessoal.Além disso, alguns acham que usando certos termos, estão sendo mais sofisticados.Na verdade, estão desvalorizando a nossa língua que é tão rica.
Por exemplo:
- Ninguém mais fica na reserva ou em espera: eles ficam de "standby";
- As empresas não fazem mais orçamento ou têm verba: elas têm "budget";
- Ninguém mais faz contato: todo mundo faz "link";
- Os descontos nas lojas são 20%, 30% "off ";
- Sem falar que não existe mais promoção: existe "sale";
- Não se faz mais abordagem: se faz "approach";
- As pessoas não estão na moda: elas estão "fashion" (que na verdade deveria ser "fashionable");
- Ou estão "style", e não estilosas (que na verdade deveria ser "stylish");
- Antigamente, se dizia que a pessoa estava por dentro, e agora a pessoa é "in";
- E ao invés de formatação ou diagramação todos dizem "layout";
- Algumas pessoas não vão pra balada: elas vão pra "night": ;
- E não precisamos dar "feedback" quando ainda podemos dar um retorno.
A lista não tem fim.E algumas coisas são difíceis de mudar.
Não sou contra língua nenhuma.Só acho que cada uma tem a sua hora e lugar.
Viva o português, ora pois!

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