quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Até o fim

O vento sopra sem controle,
e é mais uma coisa incontrolável para nós.
Arbustos unem as suas fraquezas
para ficarem mais fortes.
Para mostrar a finitude das coisas,
as lágrimas molham antes de secar.
Senão, seriam apenas choro seco
que não convencem.

Se até as palavras sem rumo,
se encontram mesmo sem rima,
também devemos deixar o vento seco
encontrar utilidade.
Também devemos
passar nossas caras amarrotadas,
e verbalizar as melhores palavras do dia.

Pois talvez o vento trabalhe a favor da poesia,
ainda que aleatória.
Pois até castigados pelo vento
os arbustos cantam.
Pois até que sequem o nosso sangue,
ainda teremos saliva para cantar,
sempre em direção à finitude das coisas. 

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Sinopse da fuga

Nenhum homem é uma ilha,
mas um homem também pode nascer de um vulcão.
Voltar para a caverna
é fugir do inferno que são os outros.
Sozinho, sem espelhos,
somem-se os defeitos.
Sozinho, sem críticos,
não há sinopse.
Só um monólogo egocêntrico
a caminho do silêncio.
 Uma única luz no escuro parece solitária,
mas é só no escuro que ela faz sentido.

sábado, 18 de outubro de 2014

Vulnerável

eu pareço inteiro protegido de pele
mas como se estou inconsciente
enxergo os meus braços e pernas
mas como se não enxergo a dor

tenho espinhas ou tenho vulcões
a ponta do iceberg congela até as veias
e eu continuo preocupado com febres
sigo combatendo sintomas banais

apenas um pequeno ponto negro
basta para tirar a pureza da goiaba
é uma mácula no mercado
quase invisível à fome de viver

variação de cor num ponto negro
me faz um pouco goiaba
variação de dor e sossego
variando entre benigno e maligno


terça-feira, 14 de outubro de 2014

Prece para a próxima vida

Que o sentimento mais fino
encontre a brecha para a próxima vida.
Que essa dor grosseira de tão grossa
não consiga atravessar.

domingo, 12 de outubro de 2014

Poema sem controle

a lua já nasce poesia
assim como insistir no erro é tradição

a lua apenas continua inalcançável
como o controle do amor

a tradição apenas ama sem controle
repetindo por repetir em aritmética involução

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Espetáculo adulto

Um dia fui forte,
como é forte a palavra inocência.
Minha imaginação,
entendimento infantil, eram minh'arma.
Fui tomando banhos,
exposto à milhares de explicações.
Me tiraram as cores;
não sou mais original.

Agora, sei fingir.
Participo da peça.
Não conheço todos no palco.
Alguns são figurantes.
Às vezes, eu sou.
Muitos diretores dirigem.
Quem só assiste deixa de fingir.
Mas bate palmas por inércia.