quinta-feira, 22 de maio de 2014

A libido ou a mentira

A libido é praga presa no cérebro a ricochetear.
Ela deve se espalhar pelo corpo.
Pelos outros corpos.

Uma mão é seguida por um braço.
Um pescoço vira e junto vai o olhar.
Para se chegar à mente, precisa-se passar pelo corpo.

Não há civilidade que resista aos fluidos.
A prataria  dos talheres é dispensada na cama.
O lençol é o maior dos guardanapos.

Ciclo humano de fantasias, esse!
Mente fantasia corpos, uns copos,
um coito, um cigarro... 
Agora, passado o transe ou a transa,
vamos nos vestir, vamos voltar a mente!
Mentira!

segunda-feira, 19 de maio de 2014

Repetir pode ser tudo de novo

Passando o pão na manteiga
Sentando fora do trono
Fora do controle
Os meus olhos são os mesmos
O meu olhar não precisa saber disso

Os meus intestinos têm vontade própria
Se eu fizer merda
Quem paga sou eu
A rotina se instala sem alarde ou controle
Melhor arriscar alguma coisa nova
Existem coisas novas de graça

Melhor redecorar a casa
Ou ainda dá pra ver tudo diferente
Se eu sentar fora do trono de sempre?


sexta-feira, 16 de maio de 2014

Um pouco de morte

A morte não deveria ser palavra forte.
A força se vai, o corpo, previsível sorte.
Entre este lado e o outro, metafísico corte.
Neste lado de carne, a dor do enfarte.
No outro, nenhum fraco corpo que mate.

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Aos 41

Aos 41 do meu único tempo,
a pressão parece aumentar.
Os chutes vêm de todos os lados.
Todos parecem querer se vingar.
O reflexo diz para matar antes de morrer.
Qualquer presa com personalidade é predada.
Falar mais de uma língua não me faz mais social entre surdos.
A minha mente está cansada.

O meu corpo ainda é forte.
Todos os meus ossos continuam lascivos.
O reflexo não mente,
mas não raciocina.
O meu corpo ainda quer mais.
Ainda levanto todos os dias com a dor mental do bailarino que caiu.
O show acontece em momentos de orgasmos,
e orgasmos são curtos momentos como a felicidade.
A coreografia, sim, é eterna e deve continuar. 

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Sete sonhos

O impossível não existe;
o que existe é o sonho.
Impossível como entender o voo,
é confiar nas asas do sonho.
A neblina encharca a sempre-viva,
então ela não voa, não vira sonho.
O flutuar, a neblina, a falta de chão
são a parte macia do sonho.
O pouso no colchão faz do sonho 
um duro chão possível.
Emendar o sonho na realidade
é o sonho de quem acorda.
Acordamos sempre
antes de transformarmos
a realidade em sonho.

Não existe pena de ganso
que resolva.

quinta-feira, 8 de maio de 2014

Lágrimas insensatas de 1850

Lágrimas insensatas,
se não quebrei uma perna
ou não me cortei na queda!
Lágrimas insensatas,
pulei de altura imensurável,
pois confundi amar com asas.

Se choro por um corpo
que não me pertence,
se desejo ser desejado
por um seio ardente,
se só tenho uma vida;
outra me é indiferente.
Lágrimas insensatas!

Me quebro todo,
me corto todo,
procuro dor de sangue.
Viver tantos anos
é sofrer estanque
dor de amor banal.
Quatro patas de corcel
que me pisem,
mais real derrocada
do que o par de pernas
que me tiram as lágrimas.

terça-feira, 6 de maio de 2014

Daqui a dois minutos

Eu mudo
Eu vou embora
Vou saber mais
Vou morto
Ou andando
Vou falar
Ou mudo
Eu passo
Eu falho
Eu mesmo
Ou você
É o mundo
Sem cabeça
Vou saber menos
Você folha seca
Eu verde
Eu vice
Você versa
Sobre isso
Eu vivo
Morrendo
E você
Sem querer
Vai viver
Eu volto
Eu vou
Outra vez
Diferente

segunda-feira, 5 de maio de 2014

O artista constante

O ser humano no seu melhor, o artista constante, 
se existisse, seria acusado de estar atuando o tempo todo.

sábado, 3 de maio de 2014

Esboço do equilíbrio


Coexistir

É peixe e água
É pular e aterrissar
É fumaça onde tem fogo
Descamisados na pelada
É vinho e confissão
É atraso e expectativa
Mãos dadas ou queda de braço
É loucura com camisa de força
É loucura sem camisa de vênus
É o bobo da corte no banho de sol da prisão
É o dono da corte e dono da prisão no banho de sauna  

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Palavras, palavras

uma palavra, duas.
um tropeço.
a memória é cruel.
espécie de rancor em repouso.
tudo que disser pode ser usado contra.

a pessoa continua.
a memória persiste.
um sopro pela boca derruba.
a palavra deixa marca.

a pessoa levanta.
o rancor acorda.
quando criança tinha licença para falar tudo.
menos palavrão.
agora, qualquer palavra derruba a pessoa.
porra!